Doutrina da Crença em Deus
Acreditamos que Deus é Uno e Único, sem par, Eterno, sem princípio e sem fim; Ele é o Primeiro e o Último. Ele é Onisciente, Sábio, Justo. Ele é o Vivo, Onipotente, Independente de todas as coisas, Ele tudo vê e tudo escuta. Ele é Ímpar entre todos os seres, e não tem nem corpo nem aparência, nem substância ou forma. Não é nem leve nem pesado, não se move nem permanece estático. Ele não se confina a nenhum espaço ou tempo, e nada é como Ele e ele não tem oposto algum. Não tem esposa, nem filhos ou companheiros, e nada se compara a Ele. Apesar de não O conseguirmos ver, Ele de tudo se apercebe. Compará-lo a qualquer uma das suas criaturas, atribuir-Lhe uma forma com rosto e mãos ou dizer que Ele desce dos céus ou que nos aparecerá no Paraíso com a forma de uma lua e etc. é o mesmo que não acreditar Nele e na Sua essência e Perfeição, e é o mesmo que ser ignorante a respeito da verdadeira natureza de Deus. O Imam Baqir (A.S.) disse certa vez:
“Ele é imensamente Maior do qualquer explicação dada pelos nossos sábios, e o conhecimento não consegue abarcar o seu Ser (ilm daqiq)”.
Da mesma forma, quem pensa que poderá vê-Lo no Dia do Julgamento não é um verdadeiro crente, mesmo que não compare Deus a mais ninguém em aparência. Quem assim pensa aceitou apenas superficialmente os ensinamentos do Alcorão e da tradição religiosa, e não faz uso da sua inteligência.
Doutrina da Unicidade Divina “Tawhid”
Deus é Único em todos os aspectos, Indivisível na Sua Essência e de nada necessita para existir. O Seu Conhecimento e Sabedoria não têm paralelos e ninguém se lhe compara em Perfeição. Ele é o Deus Único e mais ninguém deve ser adorado nas nossas orações. Quem associá-Lo a outra divindade ou pensar que a Ele pode chegar através do intercurso de outra divindade ou ser, na verdade, esse alguém é um politeísta. Para o Islam, esse é um ato de idolatria.
Todavia, ao contrário do que muitos dizem sobre os Xiitas, a pere- grinação aos lugares santos dos Imames e do Profeta (os seus sepulcros, por exemplo), não é uma forma de idolatria ou politeísmo. Trata-se de uma manifestação de respeito e de uma forma de nos aproximarmos de Deus efetuando uma boa ação, tal como visitarmos os doentes na sua ago- nia, participar de um funeral ou tentarmos ajudar os nossos irmãos mais necessitados. Por exemplo, visitar alguém doente é um ato de caridade que nos aproxima do Clemente. Não é uma forma de devoção ao doente, e por isso não se trata de politeísmo. Para a jurisprudência religiosa, os atos de peregrinação e de luto são gestos de devoção religiosa, e não de adoração aos Imames. Antes, são uma forma de reavivar os ensinamentos dos Imames, de relembrá-los e de glorificar os rituais religiosos:
“Tal será. Contudo, quem enaltecer os símbolos de Deus, saiba que tal (enaltecimento) partirá de quem possuir piedade no coração.” (C.22 – V.32)
É nossa crença que tais atos são Mushtahab, isto é, quem os praticar com a intenção de glorificar o Clemente, merece a Sua aprovação e recompensa.
Doutrina dos Atributos de Deus “ Sifat Allah ”
Deus possui os mais sublimes atributos, como a Beleza e a Perfeição. Ele é Onisciente, Todo Poderoso, Independente, Eterno. Esses atributos estão interligados. A sua Onipotência advém do seu caráter Eterno. Ele é Todo Poderoso porque é Eterno, e Eterno porque é Onipotente. Esses atributos são uma manifestação do seu caráter Único e a base do Tawhid. Além desses atributos principais, ele é também o Criador, o Sustentador de toda a vida, sem Princípio e sem Fim, e essas características estão ligadas à sua Auto-Suficiência.
Ao longo dos séculos, vários foram o que imaginaram que esses atributos (chamados de atributos “positivos”) seriam uma manifestação de um caráter Dualista. Mas Deus está acima de tais considerações, como nos diz o Imam Ali, o Amir al-Muminin15 (Príncipe dos Fiéis (A.S)):
“Os diferentes atributos de Deus não deixam de ser a manifestação de um caráter Uno, e quem assim não o entender acabará por ver mais do que Um em Deus, verá dois ou mais, e estará cometendo um engano” (Nahjul Balaghah, Sermão 1).
Doutrina da Justiça de Deus “Adl”
Acreditamos que um dos principais atributos de Deus é a sua Infalível Justiça. Ele é incapaz de tratar qualquer ser vivo de modo cruel ou injusto. Ele recompensa os que são justos entre os seus servos, e castiga os que pecam. Ele não incita os seus servos a cometerem atos que ultrapassem as suas capacidades, nem os castiga por pecados que não cometeram. Ele não se esquiva de praticar um ato de bondade, mas é contra a Sua própria natureza praticar o mal. Ele é conhecedor da excelência do Bem e da ini- qüidade do Mal. Ele é Sábio, e a Sua sabedoria reflete-se nos Seus atos.
Imaginemos, agora, que Deus tratasse alguns dos seres que criou de forma cruel ou maldosa. Teria de ser por que:
a) Deus seria ignorante e desconhecedor do conceito de Mal
b) Deus, mesmo sabendo da natureza do Mal, seria compelido a praticá-lo
c) Seria parte de Sua natureza praticar o Mal, mesmo sabendo da sua injustiça
d) Praticar o Mal seria um ato de diversão para Deus, mesmo não tendo Ele nenhuma necessidade de fazê-lo.
Qualquer uma dessas interpretações não se coaduna com a Essência de Deus. Ele é o rosto da Perfeição Absoluta e não necessita de praticar o Mal.
Todavia, alguns muçulmanos dizem que Deus pode, de fato, praticar o Mal. Dizem que Deus pode castigar os fieis e levar os desobedientes ao Paraíso. Acreditam também que Deus pode controlar os atos dos seus servos e levá-los a praticar ações que os sobrecarreguem e que, ao mesmo tempo, os pode castigar caso estes se recusem a fazê-lo.
“Ele não poderá ser questionado quanto ao que faz; eles sim, serão interpelados” (C.21 – V.23)
Resumindo, dizem que Deus pode oprimir, pode nos enganar e nos induzir ao erro. Trata-se de uma blasfêmia contra o Senhor. Ele diz no Alcorão:
“Sabei que Deus deseja a justiça para os Seus servos.” (C.40 – V.31)
“... a Deus desgosta a corrupção.” (C.2 – V.205)
“Não criamos os céus e a terra e tudo quanto existe entre ambos por mero passatempo.” (C.44 – V.38)
“Não criei os gênios e os humanos, senão para Me adorarem.”
(C.51 - V.56)
Assim como muitos outros versículos semelhantes.
Doutrina dos Mandamentos de Deus
Deus não ordena aos seus servos que pratiquem quaisquer atos sem alguma razão muito evidente, nem espera que estes pratiquem atos que os sobrecarre- guem ou que não entendam. Seria uma forma de injustiça da parte do Senhor. Todavia, o homem ignorante ou que não cumpre as suas obrigações comete um erro pelo qual terá de responder. É dever de toda a humanidade aprender e praticar os deveres da fé.
Nós acreditamos que Deus nos forneceu determinadas leis para o nosso próprio proveito, de forma a alcançarmos, através delas, bem estar e prosperidade, e nos avisa sobre os atos que Lhe são contrários. Este é um exemplo da sua Misericórdia para com os seus servos, que nem sempre sabem o que está certo ou errado.
Deus é o Beneficente e Misericordioso. Estas são características da Sua Per- feição Absoluta, que nem a nossa desobediência para com Ele é capaz de alterar.
Doutrina da Pré-determinação “Al Qada” e Doutrina da Vontade Divina “Al Qadar”
Uma antiga seita islâmica de nome Mujabbirah afirmava que Deus era responsável pelos atos de todas as suas criaturas; de que Ele as forçava a pra- ticar certos atos e que as recompensava, ou castigava, de acordo com essas ações. Acreditavam que as ações humanas eram, na verdade, atos guiados por Deus. Para esta seita, não existiam causas naturais para os diferentes atos da realidade, que emanavam todos de Deus. Para os seus pensadores, isto advinha da própria natureza da Criação de Deus, um Deus sem Par. Todavia, induziam a si próprios em erro.
Uma outra seita, de nome Mufawwidah, pelo contrário, acreditava que Deus tinha dotado as suas criaturas de plena autonomia para os seus atos, e que em nada intervinha. Para estes, a imperfeição dos atos humanos não podia estar ligada à natureza divina, tendo causas específicas na sua origem. Tais causas podiam ser traçadas e levavam até uma fonte original, Deus, que é o Criador de tudo. Os seguidores da seita resvalavam freqüentemente para uma Dualidade na figura de Deus.
A nossa posição em relação a este assunto é a que nos foi legada pelos Imames, isto é, a realidade oscila entre estes dois extremos, algo que fica entre as duas posições e nem sempre é compreendido pelos teólogos que seguiam estes dois ramos de pensamento. O conhecimento e o pensamento filosófico eram incapazes de fornecer uma resposta clara para estas ques- tões durante muitos séculos, e não se é de admirar que muitos dos que não conhecem o pensamento dos Imames do Xiismo pensem que a nossa posição se baseia no pensamento moderno dos filósofos ocidentais. Os nossos Imames, todavia, haviam formulado estas questões muitos séculos antes destes últimos.
O Imam Assadeq (A.S.) falava de forma clara sobre um meio termo em relação a este assunto:
“Não existe um controle total da parte de Deus, nem delega ele po- deres absolutos ao homem. A realidade oscila um pouco entre estes dois extremos”.
Que maravilhosa clarividência neste pensamento, e quão exato o seu sig- nificado! Ele indica-nos que as nossas ações são, em última instância, apenas nossas, e atribuíveis às nossas escolhas; por outro lado, somos criaturas de Deus, e estamos assim sujeitos ao Seu Poder, uma vez que é ele que nos deu a existência. Mas Ele não nos incita a agir contra os seus desígnios para depois nos castigar. As nossas ações, todavia, estão limitadas pelo Seu Poder, porque a Ele pertencem a Criação, e Nele reside o Juízo e a Razão. Ele é Todo Poderoso e pode controlar todas as coisas.
Acreditamos que a predeterminação e a Vontade Divina são mistérios do Clemente, e devemos entender a realidade como algo entre as duas posições mencionadas. Esta é uma das mais antigas questões filosóficas, e poucos a podem perceber plenamente. Muitos teólogos se desencami- nharam tentando compreendê-la. O homem deve procurar compreender este assunto de uma forma geral, seguindo os ensinamentos dos Imames: de que a realidade se situa entre as duas posições, de que Deus não é o responsável pelos atos individuais do homem, mas que nem por isso este não lhe está submetido.
Doutrina da “Bada”
Em árabe, “bada” significa, literalmente, “surgimento” ou “aparição”. Na tradição islâmica, essa palavra traduz, basicamente, o surgimento de uma idéia no homem que faz com que ele reflita e se abstenha de praticar um ato que, pouco antes, teria praticado sem reservas. Isto é, algo acontece que faz com que este mude de atitude e se arrependa de praticar um ato. Tal compor- tamento é parte da natureza humana e reflete a sua ignorância perante o que fazer em certas situações.
Tal atitude, no sentido descrito, é impossível de se encontrar na natureza de Deus, uma vez que, na sua origem (da atitude), estão a ignorância e a im- perfeição. Ao contrário do que muitos argumentam os Xiitas não acreditam em tal coisa, como diz o Imam Assadeq (A.S.):
“Quem quer que acredite que Deus é capaz de praticar um ato e, depois, se arrepender dele, é um descrente”
E disse (A.S.): “Está longe de mim quem pensa que Deus é suscetível de “bada”, em relação a assuntos sobre os quais ele não tenha refletido”.
Algumas tradições provenientes dos nossos Imames induziram cer- tas pessoas a pensar que acreditamos em tal conceito aplicado a Deus. Por causa dessas tradições, certos teólogos de outras seitas islâmicas acusam-nos de acreditar no “bada” e atacam os seguidores da família do Profeta. A interpretação correta sobre esse assunto é a que Deus descreve no Alcorão:
“Deus impugna e confirma o que Lhe apraz, porque o Livro-matriz está em Seu poder.” (C.13 – V.39)
Doutrina dos Deveres Religiosos
Deus ordena-nos que pratiquemos certos atos para o nosso próprio bem. Certos atos são obrigatórios, para o nosso benefício; outros, sendo prejudi- ciais, são proibidos. Outros atos são recomendáveis, embora não sejam em princípio nem proibidos nem obrigatórios. Tais mandamentos advêm da sua Infinita Justiça e Misericórdia.
Os mandamentos de Deus cobrem todas as situações da vida, e nada está à margem destas regras, embora isso nem sempre nos pareça aparente. Também acreditamos que Deus nunca nos imporia mandamentos em parte benéficos e em parte prejudiciais. Para alguns muçulmanos, os seus manda- mentos representam o Bem, e o Mal está em tudo o que nos é proibido.
Este raciocínio não é lógico, e quem o formula também acredita que Deus é capaz, por vezes, de praticar atos malévolos. Já abordamos esse pensamento anteriormente, que pressupõe que Deus seja ignorante de seus próprios man- damentos; seja o Senhor Exaltado em Glória sobre tais opiniões!
Devemos antes acreditar que estes mandamentos são para nosso único benefício, e que Deus não precisa deles para nada. Ele não precisa dos seus servos e tais regras foram-nos enviadas para nosso único benefício.